Alguns curtinhas

Era Uma Vez… (Idem, Brasil, 2008)
Dir: Breno Silveira

É uma surpresa enorme constatar o quanto esse novo filme de Breno Silveira é eficiente o bastante para cativar o espectador, da forma mais genuína e simples possível. Depois do bom Dois Filhos de Francisco, lá vem ele com uma historinha de amor, que tinha tudo para cair no sentimentalismo anti-preconceituoso, entre um favelado e uma garota de classe alta, ainda mais com um título tão sem criatividade como esse. Ao mesmo tempo em que Silveira não possui grande apelo estético, ele sabe conduzir cada cena no tom certo, e já me encantou pela maneira como filmou a aproximação entre Dé (Thiago Martins) e Nina (Vitória Frate). A história avança com reviravoltas que fazem total sentido e nunca soam gratuitas, e ainda consegue fazer crítica social. Pra completar, Thiago Martins é um achado e sua composição de um personagem ingênuo, tímido, mas apaixonado, parece falar muito mais através do olhar. Além disso, é filme de urgência e tem os dois pés no chão.

Canções de Amor (Les Chansons D’Amour, França 2007)
Dir: Christophe Honoré

Depois de um incrível Em Paris, cuja melhor cena é uma reconciliação cantada ao telefone, eis que o francês Honoré nos presenteia como o adorável Canções de Amor, dessa vez assumindo de vez o musical como forma. Não um musical clássico, mas um filme em que os personagens se pegam cantando do nada. Ismael (Louis Garrel), Jolie (Ludivine Sagnier) e Alice (Clotilde Hesme, adorável) vivem uma relação a três, quando um terrível acidente muda os rumos de suas vidas amorosas. Completa o elenco uma triste Chiara Mastroianni e ainda o insistente Grégoire Leprince-Ringuet, cada qual com seus bons momentos em tela. O texto leve e gostoso, aliado ao charme de seus atores, se espelha nos números musicais, todos muito bons, como o belo Ás-tu Déjà Aimé, que só perde para o trio Garrel-Hesme-Sagnier cantando Je N’aime que Toi nas ruas de Paris. E mesmo nos momentos mais dramáticos, o filme consegue se equilibrar e nunca perde seu charme. O relacionamento a três e, sobretudo, o desenlance gay que acontece mais ao fim nunca se impõem como algo definitivo, são somente possibilidades apresentadas aos personagens. E se isso lhes faz bem, quem pode julgar? Melhor é aproveitar as ruas (e sons) de Paris.

Mamma Mia! (Idem, EUA, 2008)
Dir: Phyllida Lloyd

Mais uma vez um filme se utiliza das canções de uma banda conhecida e com um repertório cheio de ótimas composições para construir sua história. Em Across the Universe havia uma artificialidade na forma como as músicas eram usadas para montar uma história que soava solta. Aqui nesse Mamma Mia!, se apropriando das canções do Abba, existe um foco, mas frágil pela pouca relevância da história que está contando. Sophie (Amanda Seyfried) não sabe quem é seu pai e no dia de seu casamento convida três ex-namorados de sua mãe (Meryl Streep) para descobrir qual deles a gerou. Como a dúvida só deve aparecer no fim do filme, é preciso criar vários outros momentos para fazer correr o filme e é uma alegria quando alguém começa a cantar porque as músicas do grupo sueco dos anos 70-80 são a melhor coisa do obra (destaque para Dancing Queen e a pouco conhecida Voulez-vous). Nem a competentíssima Meryl Streep consegue trazer algo de proveitoso para o filme. Mas o pior de tudo são as tentativas de trazer humor, poucas vezes eficiente.

O Ódio (La Haine, França, 1995)
Dir: Mathieu Kassovitz

Um dia na vida de quatro marginais inconseqüentes nas ruas de Paris e suas aventuras no submundo da capital francesa rendeu um dos longas mais festejados dirigidos por Mathieu Kassovitz, ator conhecido por fazer par romântico com Amélie Poulain. O filme é duro e potente, ajudado por uma fotografia em preto-e-branco intenso que traz uma atmosfera propícia ao mundo monocromático e sem vida de seus personagens. O malandro Vinz (Vincent Cassel), o negro Hubert (Houbert Koundé) e o descendente árabe Saïd (Saïd Taghmaoui) passam o dia fumando, procurando baderna, falando baboseiras e expostos a todo tipo de violência. O texto é rápido e confere força a seus personagens, na medida em que criamos aversão por Vinz e podemos passar a nos importar com Hubert, por exemplo. São personagens palpáveis. Ao fim, Said retoma a parábola, dita no início, de um homem que cai de um edifício de 50 andares e a cada lance, diz: “até agora, tudo bem”. Pois é justamente esse pensamento que define os personagens: no submundo marginal em que vivem, mal sabem eles que estão em queda permanente e quando o impacto como o solo chega, ele vem de supetão, impiedoso e arrasador, como fica claro na surpreendente cena final.

Missão Babilônia (Babilonia A.D., EUA/França, 2008)
Dir: Mathieu Kassovitz

O mais incrível é saber que o cara responsável por esse Missão Babilônia é o mesmo diretor de O Ódio. Kassovitz já tinha se vendido ao cinema comercial norte-americano com o péssimo Na Companhia do Medo e dessa vez retorna com um filme catástrofe que além de confuso, é mais furado que uma peneira. Vin Diesel é esse cara durão, musculoso, dá porrada em todo mundo e cuja função é levar uma jovem (Mélanie Thierry) aos Estados Unidos, num mundo totalmente arrasado e violento. Ela vive reclusa num mosteiro, afastada de toda a perversidade do mundo, sob os cuidados da Irmã Rebecca (Michelle Yeoh, que faz muito com o pouco que lhe é oferecido) e parece ter dons sobrenaturais, logo chamando a atenção de um grupo religioso extremista que quer seqüestrar a garota. As reviravoltas do filme são patéticas, as cenas de ação são montadas de forma tão bagunçada e rápida que não se sabe exatamente o que está acontecendo na tela; os grandes atores franceses Gerard Depardieu e Charlotte Rampling são totalmente desperdiçados. E já aprendi a fugir de todo filme que traz Vin Diesel na capa – nem Sidney Lumet conseguiu tirar proveito.

9 thoughts on “Alguns curtinhas

  1. Eu achei Mama Mia uma coisa fofa, preciso escrever sobre ele…

    Missão Babilônia é bem lixo, néam, nem tem muito o que esperar. Mas eu comia o Vin Diesel todinho, se comia!

    Beijocas

  2. Era uma Vez … é muito bom realmente, o Silveira comprovou ser mesmo um ótimo diretor. Só acho o final meio forçado, não pelo que acontece, mas pela forma como é filmado.
    O Ódio é um filmaço, forte e impactante. E, repetindo o que vc disse, é assustador que Kassovitz tenha também feito essa bomba que é Missão Babilônia. Clone muito vagabundo de Filhos da Esperança … uma pena.

  3. Como já deve saber, adorei “Canções de Amor” e o considero como um dos melhores do ano. E acho que “Mamma Mia!” cumpre sua função de divertir, apesar de ser fraco em matéria de cinema. Dos demais, quero ver “Era uma Vez”. Abs!

  4. Rafael, eu acho que “Era uma Vez” é um filme que encontra sua força no elenco, mas achei o roteiro manipulador demais.

    “Mamma Mia!” funcionou demais comigo. Acho que o filme ganha pontos por causa de sua autenticidade e sinceridade.

    Achei “Missão Babilônia” um filme interessante até o ato final, que acaba com o longa. Concordo que Depardieu e Rampling são totalmente desperdiçados.

  5. Pois é caro Rafael, o filme é difícil de achar, procurei em várias lojas incluindo 2001vídeo que tem um grande acervo e também na submarino e livraria cultura mas não achei. Eu me interessei por ele depois que li uma crítica do Rubens Ewald Filho sobre ele e também após assistir aos filmes Fôlego e Primavera, verão, outo, inverno e primavera. Ainda não achei não, caso você encontre aí pela internet pode dá o toque, mas no caso desse filme eu teria preferência pelo DVD original. Tem ele importado, mas o preço é muito alto, mais de 100 reais.

  6. Rafael, apesar da sua nota desfavoravel, ainda tenho vontade de assistir “Mamma Mia”, pois gosto de musicais (mas confesso que nao me empolguei muito com o trailer e a maioria dos comentarios que li sobre o filme). Da sua lista, o que mais me chama a atencao eh “Cancoes de Amor”, e olha que ainda nao vi “Em Paris”, que todo mundo parece amar.

  7. Rapaz, tem coisas que eu tenho medo de assistir: Mamma Mia é uma delas. Fofo por fofo, duvido que supere Canções do Amor, que realmente é otimo.

    Perdi o Era uma Vez no nosso maravilhoso cinema. Vai ficar pro dvd, embora nao acho que seja o tipo de cinema que me interesse.

    Nao lembro muito de O Odio, filme que vi na epoca do lançamento, além do fato de ter uma carga de brutalidade que impressiona. Quero rever.

    Ja Missao Babilonia… bom, esse eu passo longe.

    Abraços!

  8. Epa lá Fabiana, comer o Vin Diesel já não é assunto para esse blog. Pode guardar suas taras aí. huahuahahuuha. E o Mamma Mia justamente por ser assim “fofo” e sem muita consistência na história que achei fraco.

    Wallace, não sinto problemas com o final de Era Uma Vez, mas entendo o que você diz, pode parecer um tanto urgente demais. Talvez seja mesmo, mas não pesou tanto pra mim. O Ódio é realmente impactante e agora que você falou, faz sentido essa proximidade entre Missão Babilônia com Filhos da Esperança, com o simples fato de que o filme do Cuarón é infinitamente melhor, em todos os sentidos.

    Vinícius, Canções de Amor entraria nos 20 melhores do ano, mas tem muitos destaques, como o elenco e a trilha sonora, claro. Se Mamma Mia é fraco em matéria de cinema, já perde ponto comigo.

    Kamila, não consigo ver o roteiro de Era Uma Vez manipulador como você diz, para mim tudo acontece com toda razão de ser, sem forçar a barra. Essa simplicidade de Mamma Mia me parece mais fraqueza do texto. E o final de Missão Babilônia é mesmo desatroso, mas o filme já prenunciava isso. Tem até um clima legal no início, mas a canastrice de Vin Diesel acaba com tudo.

    Pois não é uma ladeira, Gustavo, a carreira do Kassovitz? Um cara tão promissor. E o Canções de Amor também vale a pena de ser visto!

    Então Wendel, que DVD difícil de encontrar não? Qualquer coisa te dou um toque! E vi Sem Fôlego há pouco tempo, achei bom, mas não tanto quanto Primavera, Verão… Mas o Kim é talentosíssimo.

    Você precisa ver Em Paris, Romika, acredito que vá gostar. É um tanto melhor que Canções de Amor, mas ambos valem a pena.

    Hélio, é ruim Mamma Mia superar Canções de Amor, até porque a história é tão bobinha que só as músicas do Abba salvam o filme. Era Uma Vez também não parecia me interessar não, me surpreendi com o filme. Incrível como o Silveira filma com uma simplicidade técnica, mas alcança momentos bastante inspirados. Já pela capa de O Ódio dá pra notar o tom pesado do filme.

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