Cine Ceará – Parte II

Maresia (Idem,
Brasil, 2015)
Dir: Marcos Guttmann
As angústias do artista, com sua arte e sua projeção no mundo, e as angústias do desbravador da arte, esse que busca entender as angústias do artista tempos depois de sua passagem pelo mundo. São essas as duas questões primordiais por onde trafega Maresia, primeiro longa-metragem dirigido pelo carioca Marcos Guttmann.
O filme lhe rendeu um apressado prêmio de melhor diretor no Cine Ceará. Digo isso porque o trabalho de Guttmann é competente enquanto formatação de um universo, mas nada de grande destaque. É como se mirasse naquele filme médio, que tanto falta no cinema brasileiro, nem tão arriscado do ponto de vista formal, mas também bem conduzido e de fácil assimilação, imprescindível para envolver o espectador na história.
Julio Andrade (prêmio de melhor ator no festival) interpreta dois papeis: no passado, vive o pintor Emilio Vega, obcecado pela vida junto ao mar, que lhe rende “força inspiradora” já que pinta geralmente paisagens marítimas – e, nos dias atuais, o ator incorpora o perito de arte Gaspar, obcecado pela obra de Vega e sua inserção no meio artístico.
Quando Gaspar recebe a visita de um velho senhor (Pietro Mario Bogianchini) que diz ter conhecido o artista na juventude e lhe apresenta um quadro que seria uma obra original do pintor, o filme planta questões sobre original e cópia, o que é verdadeiro e inventado, proposições não tão mais novas que buscam equilibrar realidade e criação – e Guttmann não é Abbas Kiarostami.
Nem o filme tem pretensões de tratar essas questões com rebuscamento formal, antes se apega a contar bem uma história. Adaptado do livro Barco a Seco, de Rubens Figueiredo, talvez encontremos nessa matriz literária certas opções de envolver o roteiro em certos maneirismos e algumas reviravoltas, um tanto previsíveis. É quando o fator surpresa, de certo modo, enfraquece a trama porque fragiliza uma estrutura que se ampara nesse tipo de recurso final a fim de causar certo impacto no espectador.
Salsipuedes
(Idem, Panamá, 2016)
Dir: Ricardo Aguilar e Manolito Rodríguez
Parece existir algo de exótico no fato de se programar um filme do Panamá num festival como o Cine Ceará, de recorte ibero-americano. Salsipuedes preenche esse lugar como figura de vitrine que quer se por como exemplo de diversidade dentro da grade de um festival porque suas qualidades enquanto filme são mínimas, pálidas, apesar de um trabalho de produção caprichado para um país de pouquíssima tradição cinematográfica.
Ricardo Aguilar Navarro junta-se ao roteirista cubano Manolito Rodríguez para recontar a velha história do filho pródigo que retorna ao lar. Mandado desde menino para viver nos Estados Unidos, Andrés Pimienta (Elmis Castillo) volta já rapaz feito para o enterro do avô.
Se esse enredo já é por si só um grande clichê, o restante da trama só faz a roda dos lugares-comuns e dos absurdos girar constantemente. Andrés deixou para trás não só um passado violento na Cidade do Panamá, como um histórico familiar perigoso, seu pai sendo um famoso pugilista, agora chefe do tráfico local. Quando ele retorna, o pai está preso, mas consegue fugir numa cena estapafúrdia no cemitério enquanto o avô era enterrado.
Daí, segue-se uma série de confusões e reviravoltas que tornam o filme um novelão mal-ajambrado. O pior é quando o drama familiar que toma conta das investidas do roteiro torna-se risível pelas escolhas descabidas dos próprios personagens, com direito ao filho valorizando o pai bandido e renegando as preocupações da mãe, que também vai revelar um caráter dúbio, pouco condizente com sua postura. Salsipuedes é uma salada de equívocos difícil de se levar a sério.

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