Curtinhas

Milk – A Voz da Igualdade (Milk, EUA, 2008)
Dir: Gus Van Sant

Para mim, havia alguns perigos na produção desse Milk, curiosamente pela direção de Gus Van Sant: primeiro, porque parecia um retorno dele ao mainstream, depois de um período de filmes alternativos (que renderam o excelente Elefante, o difícil Gerry, o ótimo Paranoid Park e o chato Últimos Dias); quando trabalhou para a maquina hollywoodiana fez obras comerciais e nada autorais como Gênio Indomável e Encontrando Forrester. Outra preocupação era que, sendo assumidamente homossexual, Van Sant fosse conduzir seu personagem de forma panfletária, tentando fazer justiça à causa gay assim como seu protagonista. Mas Milk é bem sóbrio, trata com respeito e admiração o engajamento desse personagem que se tornou o primeiro ativista gay dos EUA a enveredar nos meandros ardilosos da vida política. Somos apresentados à efervescência do bairro de Castro na São Francisco da década de 70, bem reconstituída pela produção, ajudada por imagens de arquivo da época muito bem inseridas na edição. Se Sean Penn é o grande nome no elenco, merecidamente, os coadjuvantes não ficam atrás, e meu destaque vai para um afetado Diego Luna. Só não entendi tanto aplauso para Josh Brolin. Mesmo assim, o filme não foge do convencional, mas a narrativa é envolvente e justa com seus personagens e a (H)história.

Bolt – Supercão (Bolt, EUA, 2008)
Dir: Byron Howard e Chris Williams

Incrível como esse filme tem um senso de aventura aguçado e ao mesmo tempo consegue ser simples e ingênuo, bem família. Bolt é um cãozinho astro-pop protagonista de uma série de TV em que ele salva sua dona Penny dos maiores perigos, se utilizando dos poderes especiais recebidos do pai da garota. No entanto, ele é o único a não saber que tudo aquilo não passa de ficção e seus poderes são todos trucagens de estúdio. Acidentalmente, ele foge e passa a buscar sua dona. Começa então uma jornada no melhor estilo “conheça a sim mesmo e encontre um valor para sua vida”, mesmo que estejamos falando aqui de um cachorro. A favor do filme, há ótimos personagens secundários, como os pombos de jardim e seus tiques, ou o espirituoso e amalucado hamster (de longe, o mais engraçado); uma gata de rua não chega a ser tão interessante assim. Existe também um nível de qualidade bem bom de animação, o que me faz lembrar de uma cena em que a tal gata ensina nosso cãozinho a fazer cara de pidão, explorando as expressões faciais do animal. O final tem ares de lição de moral, mas as sequências de aventura e o texto inteligente garantem a diversão.

Rio Congelado (Frozen River, EUA, 2008)
Dir: Courtney Hunt

Rio Congelado é um filme que se apega a sua personagem principal seguindo-a por seus caminhos tortuosos, por mais que suas atitudes sejam validadas em prol do bem estar de sua família. Ray (Melissa Leo) é essa mãe solteira de dois garotos lutando para sustentar os filhos; o pai sumiu no mundo com o pouco dinheiro da família. Eles vivem numa região fronteiriça com o Canadá, numa paisagem congelada no meio do nada. As coisas mudam quando ela conhece Lila (Misty Upham), descendente da tribo indígena mohawk, possuidores de uma reserva no local. O encontro não é nada amigável, e Lila também tem dificuldades para se sustentar sozinha. As duas então começam um trabalho arriscado de contrabando ilegal de imigrantes para o lado norte-americano. A direção e roteiro sem novidades da estreante Courtney Hunt se sustentam nas facilidades dos filmes independentes, embora a narrativa tenha algo de história bem contada. Uma pena que o texto não explore mais a relação de Ray com os filhos, cujas cenas são bem descartáveis. Já Lila é bem amparada pelo roteiro, assim como sua dificuldade para manter a maternidade. A presença de Melissa Leo na tela é marcante, através de uma personagem forte e determinada, que mesmo assim se arrisca na atividade ilícita e que tem no rosto duro e sem maquiagem de sua protagonista a imagem perfeita do sacrifício.

Última Parada 174 (Idem, Brasil/França, 2008)
Dir: Bruno Barreto

Até agora não sei qual a necessidade de ficcionalizar a história de Sandro do Nascimento, responsável pelo episódio ultra-televisionado da tragédia do ônibus 174, caso dos mais notórios da marginalidade e violência brasileiras. O filme traça a trajetória do rapaz (vivido por Michel Gomes) desde seu nascimento e a vida trágica na favela, mas faz isso de forma tão burocrática e mesmo panfletária que só consegue soar pretensioso. Há o discurso piedoso da agente social em prol das crianças carentes ou os mementos de Sandro “denunciando” sua realidade através do rap. Assim, o filme sempre tenta vencer pelo denuncismo barato, como se já não soubéssemos dessa realidade. O pior de tudo é saber que o roteiro é assinado por Bráulio Mantovani, o mesmo que adaptou Cidade de Deus. O mais estimulante de tudo é uma trilha sonora sóbria e inspiradíssima. No fim das contas, o filme não acrescenta nada à história de Sandro, e não chega nem aos pés da complexidade e do trabalho de pesquisa feito pelo documentário de José Padilha, Ônibus 174.

9 thoughts on “Curtinhas

  1. Milk é o filme que mais quero ver da safra do Oscar. E gosto do Van Sant mainstream também, especialmente de Gênio Indomável.
    Última Parada 174 é uma porcaria. Bruno Barreto é medíocre na direção, e só prestam no filme a atuação de Michel Gomes e a trilha, que vc citou. Ônibus 174 é infinitamente superior mesmo.

  2. Po..ainda não consegui ver “Milk”. Só o Bolt, hehe

    Gostei de Bolt, me lembou os filmes um tanto mais antigos da Disney, com uma parte musical no meio e aquela mensagem legal no final. Achei um filme legal, mas nada além disso, não veria de novo por exemplo. hehe 3 estrelas pra ele também.

  3. Wallace e Fabi, acho que não vão se arrepender com Milk.

    Então Wallace, também gosto do Gênio Indomável, mas é um filme encomendado, nada da carga autoral que o Van Sant construiu. E o Bruno Barreto só quis se aproveitar da história achando que era o suficiente para fazer um bom filme.

    Valeu Filipe.

    Isso mesmo Victor, Bolt é bom, mas não é o tipo de produção que dá vontade de rever. Comum mas agradável.

    Ok Cléber, para mim Milk está longe de ser um dos melhores filmes do ano, mas é bem bom e isso já vale muito.

  4. Gostei muito de Milk, ele tinha tudo para ser um filme ruim e tinha tudo para ser um filme muito bom. Acertaram no bom.

    Eu adoro desenhos, fiquei curiosa pra ver Bolt, agora vc me encorajou.

    Não gostei de jeito nenhum de Rio Congelado. ô filminho chato.

  5. Ultima Parada 174 … THIS MOVIE IS SUCKS … Vergonhoso até dizer chega … o pessoal deveria ter vergonha na cara por fazer um filme desse … PEEEEEESSSIIMO … o Les Grossman não aprovou o projeto …

    E Milk é 5 estrelas e com louvor, nunca pensei que iria gostar tanto de um filme quanto foi Milk, muito bom mesmo.

    Abraços povo!

  6. Pois é Michele, acertaram foi no diretor para fazer Milk. Veja Bolt sem medo, é uma delícia. Já Rio Congelado é mesmo um filme de fórmula, mas tem coração. E a Melissa Leo está ótima.

    O pior, Johnny, é que esse filme ainda consegue ser nosso representante para o Oscar. Muito oportunista. E Milk é muito bom, mas não acho que chega a tanto.

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