A Casa dos Sonhos (Dream House, EUA, 2011)
O grande problema desse A Casa dos Sonhos é que se trata de um filme de suspense sem suspense nenhum. Jim Sheridan (que já teve bons tempos com Meu Pé Esquerdo e Em Nome do Pai) filma a história de um homem (Daniel Craig) que larga o emprego para se dedicar à escrita de um romance. Na nova casa para onde se mudou, junto com a esposa (Rachel Weisz) e as duas filhas pequenas, começa uma paranoia que envolve o possível assassinato da antiga família que morava naquela casa. A questão é que diretor filma tudo isso como se guardasse um grande segredo, mas que já se encontra perceptível desde o início da história.
Tanto assim, que na metade da narrativa, ele é obrigado a “revelar” o mistério e passa a apostar numa trama mais absurda ainda (como um homem considerado assassino pode permanecer solto por aí, para fins científicos?). Além dos furos de roteiro, a direção de Sheridan não poderia ser mais lugar-comum, coisa da qual ele já estava se aproximando com seu filme anterior, Entre Irmãos (remake de um filme homônimo e já nem tão bom assim da dinamarquesa Susanne Bier). A Casa dos Sonhos, a despeito de sua pouca relevância, ainda tenta reverter a história no seu ato final, tentativa clara de redimir seu personagem para que o espectador saia do cinema aliviado. O efeito é o contrário, deixa-se o cinema frustrado.
Um Sonho de Amor (Io Sono L’amore, Itália, 2009)
Dir: Luca Guadignino
O cinema italiano tem essa tradição em filmar histórias familiares com um pé no melodrama, outro no realismo. Nesse sentido, Um Sonho de Amor se assemelha ao também recente drama italiano Que Mais Posso Querer, muito embora seja bem mais ousado do que esse seu insosso conterrâneo. Em ambos os filmes, mulher casada inicia relacionamento extraconjugal com outro homem. No caso de Um Sonho de Amor, Emma (Tilda Swinton, exercitando sua multiplicidade), de origem russa, renegou seu passado para viver numa família tradicional e de classe abastada. Ao conhecer o melhor amigo de um dos filhos, o belo Antonio (Edoardo Gabbriellini), sua suposta autosegurança é abalada.
Mas antes dar forma a essa relação, o filme consegue criar um panorama bastante rico dos personagens daquela família, driblando possíveis lugares-comuns nesse tipo de história. A própria Emma, apesar de estrangeira, se sente muito bem no seio da família; um dos filhos, mesmo tendo inclinação para piloto de corridas, aceita enfrentar a tarefa de ajudar o irmão mais velho a assumir os negócios da família. A filha lésbica, apesar de ainda esconder seu amor por outra garota, tem o apoio de alguns familiares – inclusive da mãe. Tudo isso ajuda a compor um ambiente sólido, apesar dessas “iminências” que ameaçam a tradicionalidade familiar. Nesse sentido, Emma sabe o quanto seu affair fora do casamento pesa nessa equação. Ao final do filme, o roteiro parece dar uma derrapada terrível, culpando sua personagem pelo adultério, numa saída moralista e rasteira, a fim de por panos quentes sobre a situação. Mas nos angustiantes minutos finais, consegue coragem suficiente para reverter o mal feito e tomar decisões fortes. E termina como um grande filme.
Lola (Idem, Filipinas, 2010)
Dir: Brillante Mendonza
Uma senhora luta contra a ventania para tentar acender uma vela na calçada da rua. Quando indagada sobre o porquê daquela luta, ela explica que seu neto foi assassinado ali no dia anterior. Essa cena inicial de Lola revela não só o tom forte do filme, que inclui ainda a avó do assassino, como já deixa claro a noção de dificuldade que essas duas senhoras terão de enfrentar a partir daí. O filme está muito mais interessado na forma como essas duas senhoras tentam lidar com a situação, não somente na busca pela dignidade de suas famílias, mas também na própria força motriz de sua sobrevivência, e muito menos em focar na resolução e comprovação do crime (o neto preso, por exemplo, só aparece uma única vez no filme, o outro parece foragido).
Não à toa chove e venta muito no filme. A figura frágil daquelas duas senhoras tentam a todo instante resistir o quanto podem às intempéries da natureza e da sociedade, a fim de romper as barreiras que lhe são impostas, em prol da sobrevivência na periferia pobre da capital Manila. Depois de ter ganhado projeção mundial em Cannes (onde apresentou os ótimos Serviço e Execução, ambos filmes porrada como esse aqui), o diretor filipino Brillante Mendonza continua marcando seu estilo seco e observacional, câmera na mão e olhar duro para as mazelas de sua sociedade. Parece não fazer concessões a seus personagens, sujeitos às forças que regem suas vidas no contexto social em que se encontram. Lola (avó em filipino) é um verdadeiro tour de força, um enfrentamento constante que clama por resistência, seja dos personagens ou de nós, espectadores.
A Casa (La Casa Muda, Uruguai, 2010)
Dir: Gustavo Hernández
É impressão minha ou esse A Casa tem problemas sérios de roteiro? Ou melhor, a escolha em fazer um filme todo em um único plano-sequência parece sabotar seu próprio roteiro, como forma de promovê-lo como o primeiro filme de terror filmado em um único take (pelo menos, aparentemente). Então, seria um grave problema de direção. Na história, pai e filha chegam, no cair da noite, a uma casa no meio do nada; eles são contratados para limpar e arrumar a propriedade que será vendida posteriormente. Mas à noite, o pai é atacado e a filha é perseguida por algo/alguém desconhecido. É certo que o filme começa estabelecendo um clima de tensão constante, se aproveitando muito da escuridão do lugar (e consegue fazer um contraste forte com a luz das lamparinas que os personagens carregam) e do uso dos sons e ruídos do ambiente.
No entanto, o filme vai apostar numa explicação de contornos psicológicos na sua parte final que põem a jovem numa situação complexa e surpreendente. Mas os envolvidos no projeto revelam uma aposta duvidosa ao filmar de forma contínua um fluxo de acontecimentos que parece necessitar, implicitamente, de alguns lapsos. Daí se questiona: o que a câmera capta é aquilo que a moça vê ou o que nós vemos? Mas se existe uma mudança drástica na percepção com que os próprios personagens enxergam os acontecimentos misteriosos e sangrentos dos quais eles mesmos são protagonistas, como a perspectiva da imagem pode ser a mesma? (existe somente uma pequena mudança nos minutos finais da narrativa). Em A Casa, forma e conteúdo não parecem falar a mesma língua.
Puxa, o Sheridan não acertou? Ele é tão bom.
O Falcão Maltês
Acho que fui a única pessoa que gostou de A Casa dos Sonhos o.O
Concordo que é fraco em alguns aspectos. Mas achei que o dir. abusou dos cliches, para fazer uma reviravolta interessante no final. Tudo bem que nem ele gostou do resultado ne, rs…
Abs!
Olá! Adorei seu blog, muito criativo! Também tenho um blog e gostaria que vc desse uma olhada. O endereço é: http://www.criticaretro.blogspot.com/ Passe por lá! Lê ^_^
Pois é, Antonio. Na minha concepção e na de muita gente por aí (menos da de Natalia aí em cima) o Sheridan deu um tiro no pé. Coisa que ele já estava fazendo no seu filme anterior. Espero que ele consiga voltar aos velhos tempos.
Natalia, acho que o final do filme tenta facilitar a vida do protagonista no sentido de livrá-lo de certas acusações morais e por panos quentes na situação. Isso me soa meio como uma covardia em assumir certas posturas.
Lê, que bom que gostou deste meu humilde espaço. Volte mais vezes aqui. Já dei uma espiada lá no seu blog.
Difícil entender o que aconteceu com o Sheridan, hein… Seus últimos filmes foram medíocres, para se dizer o mínimo. Verei esse mesmo assim, pela Weisz.
"Um Sonho de Amor" é excelente, um dos meus favoritos desse ano.
Pois é Vinícius, o filme teve uma série de problemas durante as filmagens, o Sheridan queria até tirar o nome dele dos créditos. Bem fazia ele porque é uma bomba. Mas há de se perguntar, não leu o roteiro antes de resolver fazer o filme, não? Já Um Sonho de Amor foi uma grata surpresa pra mim, bom mesmo e com (mais) uma atuação precisa da Swinton.