Festival In-Edit

É,
eu poderia ter visto mais coisas no Festival de Documentários Musicais In-Edit,
mas o tempo tem sido carrasco. Também devia ter escrito antes, mas o tempo
continua vilão. Do pouco que vi, algumas palavrinhas sobre eles:
Vou Rifar Meu
Coração

(Idem, Brasil, 2011)
Dir:
Ana Rieper

Waldik
Soriano, Odair José, Nelson Ned, Amado Batista, Wando, Agnaldo Timóteo, dentre
tantos outros cantores brasileiros, cantaram o amor desiludido, o amor proibido,
o amor amoral, o amor sincero. Atingiram com isso um público cativo que se identificava
com as letras das músicas e fizeram delas seus hinos de vida. Distante de possuir reconhecimento no meio artístico, mas, na contramão, angariando popularidade em grandes proporções no Brasil (em especial nos rincões do interior, sobretudo no
Norte e Nordeste), a música brega é celebrada em Vou Rifar Meu Coração, filme vencedor da competição brasileira do
Festival In-Edit 2012.
O
documentário destaca não somente as canções e cantores que fizeram sucesso com
esse tipo de música muitas vezes visto com “marginalizado”, mas principalmente com
pessoas anônimas que nutrem identificação com o gênero, caminho mais sincero
para se fazer conhecer as razões pelas quais a música brega tanto toca essas
pessoas. Dentre momentos engraçados e as mais variadas figuras e suas histórias
de amor, fica na tristeza das músicas e suas letras que se nutrem das próprias
situações vividas pelas pessoas, o diálogo sem rodeios com um público que se
enxerga naqueles personagens e vivências, uma espécie de comunhão de corações
partidos que se reconhecem na dor do amor. Vou
Rifar Meu Coração
busca fazer um retrato sincero de um tipo de
identificação e mostra o quanto isso pode ser forte.
George Harrison: Living in the Material World (Idem, EUA, 2011)
Dir:
Martin Scorsese
Dos
integrantes dos Beatles, George Harrison talvez seja um dos menos midiatizados e
vangloriados pelo grande público (salvo pelo punhado de beatlemaníacos que o têm
como um de seus preferidos da banda inglesa). Vem daí o interesse por essa
figura introspectiva, e talvez por isso Scorsese vá se acercando de conhecê-lo
através do depoimento das pessoas que o tiveram próximo, além dele mesmo
falando em outros materiais à disposição. Uma das qualidades do filme é passar
longe de um posicionamento de adoração, ao mesmo tempo em que consegue
vangloriar o talento de Harrison na sua postura mais tranquila e menos em
polvorosa (à sombra da efusão que John Lennon e Paul McCartney provocam), mas
ainda assim de vital importância para o sucesso que os Beatles conquistaram e
consagraram ao longo do tempo.
Com
uma edição equilibradíssima que organiza mais de 3 horas de filme, acompanhamos
cronologicamente a trajetória de Harrison, mas menos por um viés biográfico e
mais como uma junção à trajetória na banda inglesa, depois
ganhando outros projetos de vida, como discos solo e produção de cinema (em
especial, junto ao Monty Python). A partir disso é que vão surgindo os aspectos
da vida pessoal  de Harrison, infância,
personalidade, preferências e intimidade. Scorsese dá tempo para que o
espectador conheça as várias fases da carreira do artista, e suas facetas
pessoais e profissionais, com propriedade, sem atropelos, mas com admiração
devida. Sai-se do cinema cansado, mas satisfeito.
Clementina de
Jesus, Rainha Quelé

(Idem, Brasil, 2011)
Dir:
Werinton Kermes e Heron Coelho
Outro
caso de pouco reconhecimento musical que se quer resgatar encontra-se nesse Clementina de Jesus, Rainha Quelé. A sambista
descoberta tardiamente em meados dos anos 60 pelo produtor Hermínio Bello de
Carvalho, começou a cantar por acaso, encantando com sua voz rouca e potente. Trouxe
do samba diversas expressões musicais regionais, como jongos, corimas e partidos,
além da valorização e resgate de ritmos africanos. Uma das forças dessa
história é mostrar como essa mulher, mais velha, negra, pobre e de pouca
escolaridade conseguiu marcar seu nome na história da musica popular
brasileira, ainda assim pouco conhecida e reverenciada nos dias de hoje.
Talvez
por isso, o documentário esteja cercado por um tom de exaltação da figura de
Clementina (não só como intérprete, mas como pessoa de imenso coração e
carinho), o que não deixa de torná-lo um partido a favor, filme de uma nota só,
defendendo e enaltecendo a documentada, o que nem sempre tem resultados
satisfatórios, pois entendemos desde já a importância que Clementina teve,
embora essa glorificação esteja sempre martelando na tela. Temos, portanto, uma
grande artista, vindo à tona numa proposta justa, mas num documentário um tanto
quadrado.

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