Festival Varilux de Cinema Francês – Parte IV

Titeuf (Titeuf, Le
Film, França, 2011)

Dir:
Zep
 

Cobrindo
a cota de animação deste ano, com pegada mais infantil, o Festival Varilux exibiu
o engraçadinho e espirituoso Titeuf (ano
passado teve o bonitinho Um Gato em Paris,
com a mesma pegada pueril). Entramos no universo de uma criança de oito anos
que lida com as inseguranças que lhe chegam a partir da paixonite que nutre por
uma coleguinha esnobe do colégio ou a relação de separação de seus pais, tudo
muito simpático na forma como apresenta a ingenuidade do garoto.
O
nome do protagonista é uma brincadeira sonora com a expressão “tête d’oeuf” (cabeça de ovo) que, se
falada rapidamente, soa como Titeuf. O diretor Zep (nome artístico de Philippe
Chappuis) é um famoso cartunista suíço que criou o personagem nos quadrinho no
início da década de 90. Dono de um traço simples, cuja maior qualidade está nos
detalhes físicos de seus personagens (Titeuf e seu topete são inconfundíveis), faz
jus aos cartoons europeus como Asterix e Tintin.
Mas
outra de suas qualidades que transparece aqui no filme é um texto com momentos
bem inventivos e realmente engraçados, com as trapalhadas de Titeuf e seus
amigos gerando boas risadas. O tom de imaginação não fica de fora já que é
nesse âmbito que os pequenos mais se destacam, e Titeuf tem uma facilidade nata
de misturar realidade e fantasia.
Para
um filme destinado principalmente ao público infantil, é curioso notar o
interesse do personagem pelas coisas relacionadas a namoro e sexo, tipo de
curiosidade que um garoto de oito anos exprime com o mais absoluto despudor. O
filme trata essas questões com muita graça, próprio de um humor francês mais
despojado e menos moralista, mas sem exageros, claro. É um filme agradável, no
visual e no enredo.
O Monge (Le Moine,
França/Espanha, 2011)
Direção:
Dominik Moll
O Monge poderia muito
bem se assemelhar a um dramalhão novelesco, com reviravoltas, surpresas e
descobertas que lembra uma trama rocambolesca, tantos são os entrecruzamentos
das tramas e dramas de seus personagens. Mas longe de um possível tom lírico, o
gótico e o trágico rodam a obra, tomando de mistério a rotina de um convento de
monges capuchinhos na Espanha de meados do século XVII. O filme é adaptado do
romance gótico homônimo escrito pelo inglês Matthew G. Lewis em 1796.
A
figura central aqui é o padre Ambrósio (Vincent Cassel), órfão deixado à porta
do convento, criado naquele ambiente e formado para ser um grande orador
religioso, dom que o dota de prestigio e admiração por parte do povo que
assiste, hipnotizado, a suas pregações. Ambrósio é também um exemplo de devoção
(assim como a Luce de Aqui Embaixo),
exibe uma austeridade que impõe o respeito dos demais no convento.
Mas
o filme acrescenta no enredo outros personagens, como o misterioso noviço que
deseja se juntar aos monges depois que sofreu um terrível acidente que deixou
seu rosto e parte do corpo queimados, usando uma máscara o tempo todo para se
proteger do sol (criando, assim, uma figura das mais misteriosas). Há ainda a
história paralela do casal apaixonado, ele um nobre rico e ela uma bela e
humilde jovem, sem títulos de nobreza, que insistem no relacionamento contra a
vontade da mãe doente da moça. Junta-se ao todo o caso da freira que mantém um
relacionamento carnal com um homem e deseja revelar seu segredo da melhor forma
a fim de buscar ajuda.
O
início do filme se ocupa em apresentar todas essas tramas enquanto percebemos o
clima sombrio que a narrativa vai desenhando naquele ambiente, as trevas com
que a Idade Média se fez conhecida marcando presença como atmosfera de tensão,
onde deveria reinar a paz religiosa. A cena da procissão com os fiéis levando
velas acessas sobre a cabeça, com a cera derretendo em cima deles, é uma das
imagens fortes desse filme. E é essa percepção de temor que será posta aos
personagens à medida em que suas histórias se cruzarem e as surpresas aparecerem.
Contribui
bastante para essa atmosfera a fotografia que prima por um contraste forte
entre claro e escuro (bem e mal? – por vezes representado na própria figura do
padre Ambrósio). É uma luz intensa, seja do negrume que às vezes toma conta
total de parte do quadro – e do rosto dos personagens –, ou do brilho que
resplandece nas cenas externas, à luz forte do dia. É como se os personagens
caminhassem a todo o momento nessa tênue fronteira, seus atos sendo o que os
leva para um ou outro polo.
A
relação de Ambrósio com o misterioso novato, principalmente depois que este
último revelar certos poderes secretos para fazer curar as intensas dores de
cabeça do monge, ganha ares de mistério que facilita a perigosa proximidade do
pecado a que ele nunca se imaginou chegar. Mesmo assim, a narrativa faz questão
de complicar as coisas, fazendo surgir surpresas que sempre põem em cheque as
expectativas que o próprio filme gera. O contato que Ambrósio fará com a jovem
apaixonada é um desses desvios que o filme apresenta sempre com novas nuances
dramáticas. 

Se por vezes isso
cria uma boa impressão de surpresas bem-vindas, o filme perde também no fio
narrativo que segue por caminhos tortuosos, deixando de dar profundidade aos
conflitos centrais dos personagens, mudando demais suas perspectivas
dramáticas, o que atrapalha a identificação do público. O final piora um tanto
as coisas, pois toma de coincidências para arrematar o destino daquelas
pessoas. Assim, O Monge tem suas
curiosidades e acertos, mas não deixa de esconder suas irregularidades.

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