Monstro-deus

Godzilla (Idem, EUA/Japão, 2014)
Dir:
Gareth Edwards
É muito
curioso que uma nova versão do mito do Godzilla chegue aos cinemas poucos anos
depois do acidente nas usinas nucleares de Fukushima. O Godzilla já representou
o medo contra as armas atômicas após o desastroso final da II Guerra quando
apareceu nos cinemas japoneses em início dos anos 1950 como esse monstro
gigantesco, fruto aberrante das explosões das bombas atômicas.
Agora,
mais uma vez revisitado pela indústria cinematográfica hollywoodiana, Godzilla é fiel ao histórico da criatura
japonesa gerada em decorrência da insistência humana em manipular a perigosa
energia nuclear. O filme conduz com precisão o iminente acordar da fera quando
duas outras criaturas desconhecidas, também originadas das experimentações
nucleares, põem em risco a vida na Terra.
Existe
prazer em experimentar certa atmosfera de apreensão que o longa constrói sem
pressa, especialmente ao acompanhar os desvarios e a preocupação irada do Dr.
Joe Brody (vivido intensamente por Bryan Cranston). Cientista que perdeu a
esposa (Juliette Binoche), há 15 anos, num acidente na usina nuclear onde ambos
trabalhavam nas Filipinas, ele está convicto da existência de algo sobre-humano
prestes a acordar por entre as águas do Pacifico.
É,
portanto, menos um filme de ação e pancadaria desenfreada, vide o exemplo da
quase a totalidade dos blockbusters
que são lançados constantemente nos cinemas, e mais uma história de aflição e
catástrofe iminente. Há, como de praxe, a história familiar que serve de
contraponto microscópico à grandiosidade do(s) monstro(s) que chegam e arrasam
o que há pela frente.

A
subtrama da família dilacerada marca presença aqui porque o Dr. Joe possui um
filho, o soldado Ford (Aaron Taylor-Johnson), um tanto afastado do pai e tendo
deixado mulher (Elizabeth Olsen) e filho pequeno para lutar por seu país. Mas é
nessa reconfiguração do drama humano que o filme mais se perde porque os
conflitos dos personagens são frágeis, até certo ponto descartáveis, constando
somente como lugar-comum das produções desse tipo.
Muito
curioso isso porque Edwards dirigiu anteriormente o também ótimo Monstros, produto muito diferente desse
novo longa. Tratava-se de um falso filme catástrofe porque se aproveitava das
marcas do gênero para falar do drama pessoal de duas almas melancólicas e seus
conflitos emocionais. O fator humano que tanto sobrava nesse filme é justamente
o que falta ser trabalhado com maior propriedade em Godzilla

Sobra
então a iminência do confronto entre os monstros e a tentativa humana de
detê-los, e também de compreendê-los. É aí que no final entende-se a natureza
complexa do Godzilla e aquilo que representa na ordem natural das coisas, ainda
que fruto da estupidez humana.

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