Nossa Irmã Mais Nova
(Umimachi Diary, Japão, 2015)
(Umimachi Diary, Japão, 2015)
Dir: Hirokazu Kore-eda
Relações familiares, em especial questões de parentesco e pertencimento familiar, já estavam inscritos no filme anterior do diretor japonês, o ótimo Pais e Filhos – de certa forma é algo muito forte na obra do cineasta. Kore-eda continua investindo nessa seara, agora aproximando irmãs e remexendo mais uma vez no baú de memórias e sentimentos pessoais de uma família
O cineasta tem refinado cada vez mais a capacidade de tratar de dramas complexos e emocionalmente exigentes, mais para seus personagens do que para o espectador. Nós somos levados a observar o cotidiano de um lar que recebe um ponto de variação, tudo sem muita pressa. De longe, as questões que se colocam aqui não são grandes conflitos nem exigem reviravoltas gritantes, o tom do Kore-eda é outro. No entanto, para os envolvidos na trama, o que se dá na história mexe com memórias do passado e refletem angústias e anseios que ainda persistem no presente.
Há um grupo de três irmãs que vivem juntas numa mesma casa e são independentes, a vida segue bem e tranquila. O filme já começa com a notícia da morte do pai, separado da mãe delas há muito tempo, vivendo com outra mulher numa cidade mais afastada. Ter de ir ao velório significa se conectar com uma história que há muito ficou para trás, aparentemente resolvida, mas também conhecem a meia-irmã Suzu (Suzu Hirose), tímida e ingênua. A empatia entre elas é imediata e logo Suzu é convidada a se mudar e ir morar com as irmãs mais velhas.
É claro que isso vai gerar consequências que colocam em questão velhos temas e fantasmas do passado, mas pesa muito mais no filme a maneira como essa convivência vai se formatando no dia a dia daquela família incomum com sua nova integrante. O fluxo de tempo é esse mesmo da rotina cotidiana e suas pequenas descobertas que, quase por acaso, também é uma forma de colocar em evidência os descaminhos da família e as feridas abertas que persistem e sempre irão coexistir com cada um. Suzu inclusive representa a ponte com o pai ausente que se renova no imaginário das irmãs a partir das lembranças da garota mais jovem com a qual o pai se dava muito bem, ao contrário das outras.
Talvez nesse filme, mais que nos anteriores, Kore-eda apele um pouco mais para o melodrama, especialmente no uso da trilha sonora pontual que comenta cada momento mais emotivo que emerge na trama. Mas a delicadeza e o apuro que embalam esses momentos nunca os tornam exagerados. O cineasta crê na união como maneira também de distensão dos conflitos, sem que seja preciso alcançar um estágio limite de explosão e furiosa, apesar dos arroubos mais dramáticos que surgem – caso da aparição da mãe em dado momento, o que faz surgir certos rancores inevitáveis.
Cada uma daquelas jovens mulheres, na sua responsabilidade de seguir a vida com suas próprias pernas e convicções, vai se revelando para o espectador, tanto naquilo que as fortalece, como nas suas fraquezas. Mas é no traço da acolhida que o filme melhor reacende o sentido de viver em conjunto. É também através de um trabalho de liberação da palavra, e consequentemente da escuta, que aquelas personagens se dão conta do emaranhado maior do que é ser uma família ou, mais precisamente, encontrar uma.