Dia de Visita (DF/BR, 2007)
Dir: André Luis da Cunha
Depois que os dois filhos de Dona Sônia foram presos, essa senhora evangélica passou a visitar a cadeia e ajudar os outros presos, se comunicando com suas famílias e lhes dando suporte junto às instancias judiciais. O curta é mais a celebração da luta dessa corajosa mulher, nos dando um baita exemplo de solidariedade, mas que não possui nenhum grande atrativo cinematográfico. Chega um momento que se torna extremamente cansativo acompanhá-la pelas ruas, enquanto sua fala em off perpassa os longos 25 minutos de filme. Ela discute sobre a lentidão e injustiça do sistema judiciário, a possibilidade de redenção dos presos e o bem-estar em ajudar outras pessoas necessitadas, coisas que não chegam a ser novidades. Mas ser testemunha de seus esforços é algo que não podemos ignorar.
Esconde-Esconde (RJ/BR, 2007)
Dir: Álvaro Furloni
Quando seu Amaro chega em casa e encontra a sopa no fogão já queimada, ele procura a mulher que está escondida no armário brincando de se esconder do filho Marquinhos. Ela chama o garoto para vir almoçar, mas ele não vem. Percebemos a cara de preocupação e tristeza de seu Amaro, para logo depois descobrirmos que o filho do casal já morreu. A fotografia em preto-e-branco um tanto desbotado dá o tom de melancolia que o filme carrega, nessa tentativa de fuga evidenciada pela brincadeira de esconde-esconde. Detalhes que me incomodaram um pouco no início (a preocupação em mostrar as câmeras de vigilância, a diferença de idade entre o casal) fazem total sentido ao fim da projeção, quando o curta consegue nos pegar de surpresa com uma reviravolta ainda mais triste. É uma reflexão sobre a impossibilidade do tempo em curar as cicatrizes e de como as pessoas podem deixar rastros indeléveis em nossa memória. (Assista)
Santiago (RJ/BR, 2006)
Dir: João Moreira Salles
É uma experiência no mínimo curiosa e extremamente fascinante assistir a esse documentário de João Moreira Salles, embora ainda não saiba o quanto exatamente eu tenha gostado (as quatro estrelas e meia me parecem justas, mas elas nunca são definitivas). Ainda assim, o filme é difícil por exigir do espectador atenção e envolvimento a fim de refletir sobre o autor e seu personagem. E é incrível como Santiago parece crescer na memória cada vez que penso nele.
Mas de uma coisa eu tenho certeza: o filme não é primeiramente sobre Santiago, mordomo da riquíssima família Moreira Salles, mas sobretudo acerca do fazer cinematográfico e, mais ainda, sobre seu próprio realizador. Confesso que nunca vi um diretor se expondo tão diretamente numa autocrítica bastante corajosa. Daí Santiago alcança um tom de sinceridade absurdamente encantador.
Em 1992, João Moreira Salles resolveu fazer um documentário sobre a figura do mordomo da família por achá-lo fascinante (e realmente o é). Com mais de nove horas de gravação, teve uma dificuldade enorme em montar o material (falta de experiência), deixando o trabalho incompleto. Dois anos depois, Santiago veio a morrer. Em 2005, Salles resolveu concluir o único filme que não conseguiu terminar. O material era o mesmo, ele que já era outro.
E Santiago se mostra um personagem fascinante: erudito e refinado, possui um conhecimento enorme sobre dinastias importantes, sobre cinema, música clássica, literatura e fala vários idiomas. Mesmo velho, possuía uma memória de elefante e uma lucidez ímpar, além do carinho que demonstra pelo diretor, seu patrão, o Joãozinho.
Narrado em off, sempre em primeira pessoa, o diretor conta como tinha planejado, na época, o roteiro, as filmagens e as entrevista com o mordomo que já estava aposentado e vivia sozinho num apartamento. O filme se constrói a partir da própria construção, pois além de explicar o processo das filmagens, o filme insere momentos em que o próprio diretor dá instruções para Santigo, como se portar, o que falar e de que forma. Aqui, podemos discutir o documentário também como falseamento da realidade. Tudo que vemos será mesmo verdadeiro, puro?
Tudo isso para que Moreira Salles faça uma reflexão sobre si mesmo. Em determinado momento ele chama a atenção para os planos do filme que são sempre distantes e aí ele percebe o quanto as filmagens que realizou foram secas e imperativas. Ele não deixava espaço para que seu personagem exista por si só no filme que queria fazer, mas sempre da maneira que o João queria que ele (a)parecesse. Santiago acatava prontamente o que era ordenado, como bom empregado que foi. Agora, João se envergonha disso, faz o filme para tentar se redimir, e é nessa reflexão sincera e amarga que o filme alcança um nível de humanidade elevadíssimo. Uma verdadeira pérola.
Esconde-Esconde é fantástico. Engraçado como surpreende a gente
Filme surpreendente Iulo. Fiquei impressionado ao fim. Tu lembra de Éder, que estudava com a gente? Ela tava do meu lado e ria o tempo todo com a mulher se escondendo. Mas o final cala fundo. Bem que eu tava achando estranho ele ser mais velho que ela. Mas depois as coisas se explicam.
Dos filmes citados no post só ouvi falar de “Santiago”. O filme do João Moreira Salles passou em uma Sessão de Arte daqui e seu texto sobre a obra fez com que eu me sentisse arrependida por não ter conferido o filme.
Que beleza de cobertura, Rafael. So to lamentando a sessao que deve estar acontecendo exatamente agora, com o filme do Kleber Mendonça.
Quanto ao Santiago, acho que te falei que achei um saco. Sempre desconfio dessas confissoes e exposiçoes que alguem faz de si. E o filme realmente deveria se chamar “Joao Moreira Salles”, e nao “Santiago”, tamanha auto-importancia que o diretor se dá. Sem falar que o pobre do mordomo/criado continua sendo uma pessoa exotica nesse filme-sobre-o-filme. Bom saber que as pessoas nao suportaram, assim nao compro ele quando sair em dvd (so depois, quando mais barato).
Abraços!
Havia lido um pouco nos jornais, mas sem muita atenção, há um bom tempo, sobre esse documentário SANTIAGO, que nunca tinha parecido tão fascinante (pois não sabia sobre o seu conteúdo). Se já tiver saído em DVD, vou seguir a dica e procurar assistir.
Cumps.
Sou extremamente curioso em relação a esse “Santiago”, um dos filmes nacionais mais comentados (e elogiados) dos últimos anos. Pena que não passou por aqui – nem sei se já saiu em DVD.
Ih Kamila, pode ficar arrependida sim, é um filmaço. Mas não vai agradar a todos, com certeza. Na sessão aqui muita gente abandonou a sala.
Hélio, só agora me caiu a ficha do porquê de você sempre querer saber a reação do público, puro faro comercial. Tome vergonha, devia comprar todos os filmes mais alternativos. Se eu soubesse disso, nem tinha falado nada sobre a reação a Santiago. E acredito que esse seja justamente o grande atrativo do filme, a exposição do diretor numa autocrítica das mais sinceras. É também um filme sobre o fazer cinematográfico e para discutir isso a figura do diretor é importantíssima. E o mordomo está lá apresentado como aquela figura fascinante. Sobre Crítico, eu escrevo amanhã.
Gustavo e vinícius, eu acredito que Santiago não tenha chegado em DVD ainda, mas assim que sair não deixem de conferir. Eu também estva super curioso para ver e terminei a sessão desconcertado. É uma experiência única. Passou em pouquíssimos lugares e se não fosse essa Mostra, não chegaria aqui nunca nos cinemas.