O Céu de Suely (CE/BR, 2006)
Dir: Karim Aïnouz
Há algo de brutalmente melancólico na atmosfera naturalista de O Céu de Suely que talvez seja o que torne esse segundo filme do cearense Karim Aïnouz (Madame Satã) tão especial. E renovador, se o colocarmos ao lado da filmografia brasileira atual fazendo paralelo talvez com o ótimo Cinema, Aspirina e Urubus. O Céu de Suely é um sopro de vida, a busca da realização de uma existência melhor. Pena que essa realização parece nunca vir.
Depois de fugir para São Paulo com o namorado, Hermila volta para sua terra natal no interior do Ceará, com um filho no braço, já que a sobrevivência na capital se tornou difícil. Espera, então, a volta dele, mas quando percebe que nunca vai chegar, vê a necessidade de dar um rumo à sua vida. É quando decide rifar o seu próprio corpo como forma de juntar dinheiro a fim de sair dessa situação e ir para outro lugar onde pretende encontrar a “felicidade” (o título original do filme seria “Rifa-me”).
Mesmo assim, as ações da personagem se mostram às vezes ingênuas e inseguras. Na espera pelo namorado, sua intenção era trabalhar fazendo gravações de CDs e DVDs piratas. Em outro momento, numa cena tocante de enfrentamento entre Hermila e uma outra personagem, somos testemunhas de sua fragilidade ao ser forçada a se desculpar pelos rumos que sua vida levou.
Vivida intensamente pela atriz Hermila Guedes (todos os personagens recebem o nome dos respectivos atores que os interpretam), a personagem sabe que aquele não é o seu lugar, ali não é feliz. E é a busca pela felicidade que move essa forte nordestina nessa sua empreitada de vender o corpo e sair daquele lugar que lhe é tão opressor.
No filme, tudo é muito seco, muito cru, desde a relação dos personagens e suas ações até a forma como o material é editado. Isso torna o longa bastante natural e consequentemente verdadeiro. E muita coisa contribui para isso: a direção sóbria, o texto cru e enxuto, de fala nordestina carregada, mas nunca caricata, e o desempenho de todos os atores. Da entrega total de Hermila Guedes a sua personagem ao matuto desconfiado e brutalizado vivido por João Miguel.
Outro ponto interessante que contribui para o clima naturalista do filme é a trilha sonora casual, composta de músicas bem ao estilo interiorano, “bregas” mesmo. Aos ouvidos do espectador, pode parecer feio, mas é uma forma de contextualização daquele ambiente e é essa música que embala os poucos momentos de felicidade que a personagem se permite, e da qual pouco desfruta. Há ainda uma trilha original que possui uma significação importante no filme.
O mestre da direção de fotografia Walter Carvalho nos presenteia com belas cenas, principalmente aquelas ao ar livre, auxiliadas pelos ótimos enquadramentos (como a cena final, por exemplo, que é ainda um dos grandes momentos do filme). Esteticamente bem estruturado, o diretor sabe onde posicionar a câmera e capturar o melhor ângulo, demonstrando total controle sobre a narrativa.
Sem ser, maniqueísta, hipócrita e muito menos sentimentalista, Karin Aïnouz constrói uma narrativa bruta, mas cheia de significados. Com muita sutileza, vamos tomando consciência do drama daquela personagem trágica. Seguindo em seu caminho tortuoso e inesperado, Hermila é um ser errante, tendo somente o céu como testemunha.
Suely considero um ou se não, o melhor filme nacional que vi em toda a minha vida … eu tenho orgulho de ter o dvd, vejo sempre quando posso para admirar um filme simples, verdadeiro, com interpretações naturais, assim fazendo que quando assisto, sinto o verdadeiro cinema nacional em ação …
é o cinema nordestino cresendo e seguindo em frente
até mais amigo
Pois é, Johnny. O Céu de Suely me conquistou de tal forma que o acho irretocável. Não gosto muito de utilizar a palavra “perfeito”, mas nesse caso é a palvra certa para definir o filme. E o cinema nordestino, principalmente desse eixo Ceará-Pernambuco, vem crescendo muito. E a gente é que sai ganhando.