Versões de uma quase mesma história

A Visitante
Francesa

(Da-reun Na-ra-e-seo, Coreia do Sul, 2012)
Dir:
Hong Sang-soo
  

Não é à toa que o cinema do coreano Hong Sang-soo seja tão
relacionado aos filmes do francês Eric Rohmer. Existe em ambos uma obsessão
pelos atores e suas interlocuções que seus filmes se constroem basicamente dos
encontros e desencontros dos tipos que se esbarram, tendo nos diálogos sua
maior força de sustentação. Dos personagens rohmerianos que falam pelos
cotovelos, Sang-soo parece ter aprendido a agradabilidade da fala, flertando
com o melodrama e a metalinguagem, tudo muito prosaico e com impressão de
cotidiano.
Porém, por mais marcante que seja esse tom de rotina, tem-se
em A Visitante Francesa uma protagonista em situações
“inusitadas”, uma vez que ela é uma estrangeira num país de cultura tão
diversa. Mas mais que isso, Sang-soo brinca com os personagens em versões
diferentes de uma quase mesma história, enxergando a protagonista em ocasiões
distintas a partir de sua chegada a uma praia na Coreia.
A pitada de metalinguagem está no fato de que a narrativa é
pensada por uma jovem roteirista que escreve um filme no qual essa personagem,
sempre chamada Anne (interpretada por Isabelle Huppert), chega ao lugar
assumindo posições diferentes: uma cineasta que teve um lance amoroso com o
anfitrião coreano; uma mulher que tem um caso extraconjugal com um coreano; e
outra que viajou ao lugar para se esquecer do marido que a trocou por uma jovem
coreana.
Desde
já se desenham as artimanhas do enredo em aproximar os segmentos, com os
personagens secundários com quem ela se relaciona se revezando em seus papeis
ou surgindo como novidade em algum momento. De qualquer forma, é sempre
interessante acompanhar as novas funções que cada um desempenha na dança de
cadeiras que o filme promove. A brincadeira narrativa está também na forma como
Sang-soo, com sua câmera sempre tranquila, consegue ecoar certas situações com
um simples zoom ou enquadramento similar ao que a gente já havia visto antes,
motivo para o riso no rosto do espectador mais atento. 


O melhor é que não existe um cálculo, uma necessidade de ligar os
pontos que são comuns aos segmentos. Muito pelo contrário, o diretor parece se
sentir muito à vontade para brincar com as recorrências que ele mesmo implanta,
ao mesmo tempo convidando o espectador a percebê-las e também surpreendendo-os
pelos rumos inusitados que as histórias podem seguir. 
E
engana-se quem pensa que Isabelle Huppert brilha sozinha aqui. Distante das
personagens fortes que costuma interpretar, dá espaço para que todos no elenco
se equiparem num tratamento sóbrio de personagens. É essa percepção de vida
cotidiana tão presente nos filmes de Sang-soo. Ele segue fazendo esse cinema
simples, naturalíssimo, leve, desdobrando as narrativas. Espera-se que ele não
comece a se repetir, justo porque seu olhar de cronista diante do mundo dota
seus filmes de um interesse pelas coisas palpáveis, pela estranheza agradável
do cotidiano, que não se deve perder de vista.

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